Embora seja possível observar sinais de uma certa recuperação econômica refletida na renda disponível das famílias – com crescimento real estimado em 2,5% para 2018 – o consumo dos brasileiros ainda se mostra bastante tímido. O alto índice de endividamento da população, somado às incertezas econômicas, contribui para inibir grande parte dos gastos com produtos considerados supérfluos e, especialmente, o consumo fora do lar.
Em 2010, a renda disponível por brasileiro era de R$ 19,7 mil ao ano. Em 2014, saltou para R$ 23,4 mil e, em 2018, não deve sequer chegar aos R$ 21 mil. Com este cenário, o consumidor ainda se vê obrigado a racionalizar algumas de suas decisões de compra, buscando produtos, marcas e canais mais acessíveis ou até mesmo cortar despesas não essenciais. A recuperação da renda disponível ao nível pré-crise, em 2014, só deve acontecer em 2022 (em termos reais a preços constantes de 2017).
Horários dos jogos não impulsionam consumo nos bares
Os jogos do Brasil na primeira fase devem acontecer, majoritariamente, em dias durante a semana e com horários variando entre 11h e 15h. Em pleno horário comercial e impossibilitadas de liberar seus funcionários por vários dias do ano, muitas empresas pretendem transmitir os jogos do Brasil dentro de suas dependências, providenciando os comes e bebes. Assim, a Copa do Mundo FIFA 2018 não deve ter impacto significativo no resultado anual da indústria de alimentação fora do lar em 2018.
Bares e pubs, que são uma das escolhas mais comuns dos consumidores que preferem ver os jogos fora de casa, não devem se beneficiar tanto do evento este ano, tendo em vista o horário da maioria dos jogos. A expectativa é que os bares e restaurantes apresentem uma performance estável em número de transações este ano em relação ao ano anterior. Em comparação à última Copa do Mundo, realizada em 2014, a categoria registrou crescimento de 2% em transações frente ao ano anterior. Além de os horários dos jogos terem sido mais favoráveis, o torneio ainda aconteceu no Brasil, o que colaborou para que os consumidores aproveitassem o evento de uma maneira mais festiva e contribuiu para a performance positiva da categoria. Já em 2010, quando África do Sul foi a anfitriã do torneio, o volume de transações em bares e pubs no Brasil registrou crescimento anual de 4% em relação a 2009. Porém, é importante ressaltar que esse resultado aconteceu não apenas em função do evento naquele ano, mas também porque o Brasil vivia naquele momento uma situação econômica diferente da de 2014 e da atual, com menores níveis de desemprego e taxa de inflação mais baixa.
Copo meio vazio durante a Copa
Em 2010, os brasileiros consumiram cerca de 65 litros per capita de cerveja e 81 de refrigerantes, considerando vendas no varejo e também bares/restaurantes. Já em 2014, os volumes foram de 68 litros de cerveja e 78 de refrigerantes – um aumento e queda de, respectivamente, de 4%. Em 2018, no entanto, o consumo de cerveja por consumidor não deve passar dos 60, enquanto que o de refrigerantes deve cair para 62, apenas. Não se pode negar que a expectativa para a indústria é menos animadora que nas edições anteriores do evento.
São vários os fatores indicados para explicar a visão mais conservadora da indústria neste ano. Além da conjuntura econômica e dos horários dos jogos, a busca por um estilo de vida mais saudável somada à megatendência global de mindful drinking (consumo menor, mas focado em produtos com posicionamento superior) têm impacto significativo na redução do consumo de bebidas, sobretudo alcoólicas e açucaradas. Outro fator está na influência da sazonalidade no consumo de bebidas.
As temperaturas médias anuais mais elevadas e o verão prolongado – geralmente marcado pelo fim do Carnaval – influenciam positivamente no consumo de bebidas no Brasil, tanto alcoólicas quanto não alcoólicas. Em 2014, ano em que a temperatura média na região sudeste chegou a 28°C (segundo dados do Instituto de Meteorologia da UNESP) e o Carnaval aconteceu no início de março, a sazonalidade foi responsável por 20% do incremento no volume de vendas de cervejas no ano. Para 2018, com Carnaval acontecendo em fevereiro e temperaturas médias até maio significativamente mais baixas em comparação aos anos anteriores, espera-se que a sazonalidade não seja um fator de peso para estimular positivamente a demanda por bebidas.
Nem tudo está perdido...Copa impulsiona videogames
O segmento de videogames deverá apresentar em 2018 uma performance melhor em relação ao ano passado, tanto em categorias voltadas para consoles e computadores quanto os jogos digitais. Além de fatores específicos do segmento que impulsionam o consumo - como a crescente alta de penetração de smartphones e preços mais acessíveis dos principais consoles em relação aos anos anteriores -, a Copa do Mundo possui um papel importante para alavancar a demanda.
Após três anos consecutivos de quedas em consoles, projetamos um crescimento de 6% em volume de vendas. Jogos como FIFA 18 e sua tão esperada extensão oficial da Copa do Mundo são capazes de atrair novos consumidores no afã durante e após os jogos. Este efeito impulsionador não se limita, portanto, ao movimento maior de vendas de jogos, mas também à capacidade de transformar novos consumidores em gamers, ainda que de forma passageira.